terça-feira, 25 de outubro de 2011

Petrolina - onde o preto é branco e o branco é preto

É um pequeno manual pra quem veio a Petrolina e não se acostumou; pra quem virá a Petrolina; ou quem sempre viveu e não aprendeu a regra essencial do bom-viver. Se você leu Orwell e aprendeu o que é duplipensar, você está pronto pra vir morar em Petrolina. Se sabe inclusive internalizar o duplipensar e desenvolveu o duplifalar, vai viver em Petrolina feliz por muitos e muitos anos. Petrolina é a terra onde você não é o que é e é o que diz não ser, salvo raríssimas exceções.

Petrolina é uma terra (repito, salvo raríssimas exceções) onde o católico não vai à missa; se vai, comunga sem se confessar; se confessado está, não pediu perdão a D-us; se pediu perdão a D-us, não pediu a quem ofendeu; se não ofendeu, não pediu perdão por ter ofendido. É onde o crente não bebe, não fuma e não faz sexo fora do casamento, odeia os gays e é honesto até o talo - mas ou bebe, ou fuma, ou fode, ou é gay, ou é desonesto, ou todos os cinco de vez. É onde o gay é hétero, ou se muito admite, é bissexual. É onde se ama a amiga, e por trás, pinta-se-lhe a caveira. É onde o melhor amigo é o irmão de todas as horas, mas dentro do coração, é um boçal arrogante que você quer que se foda. É onde o certinho nunca é certinho. É onde o namorado ou o marido fiel põe cornos à namorada ou namorado a todo o tempo, e vice versa. É a terra onde não se aplica o ditado de que o que os olhos não veem, o coração não sente: os olhos podem ver, os ouvidos podem ouvir, o coração pode sentir, mas se você disser que o que é, não é, então está tudo certo.

Abro exceções, mas muito poucas. Eu aprendi que o duplipensar e o duplifalar é essencial pra viver em Petrolina. E vou me adequando, vou mudando. Até porque em Petrolina, se você me disser que o preto é branco e o branco é preto, por mais que eu saiba que o branco é branco e o preto é preto, o branco será preto e o preto será branco.

Um comentário:

Nuno Coelho disse...

Capitão,
Num dia cheio de más notícias ver-te novamente escrevendo é como uma brisa suave no meio do calor de um deserto.
Não é segredo que há muito o acompanho aqui (ensaiando mesmo alguns posts sem muita valia a não ser pra mim mesmo) e que suas letras me agradam sobremaneira, inclusive eu já lhe disse isso.
Seja bem-vindo de novo meu amigo!
Ao menos este leitor baterá ponto por aqui quando as inquietações do mundo lá fora exigirem poucos momentos em que a mente vê-se abrasada pela qualidade fraternal das tuas linhas.
Um grande abraço,
Nuno Coelho Pio